A amiga que mora em Paris

Ter um amigo morando em Paris deve ser bom. Nunca tive. Tive melhor: uma amiga que não morava aqui, mas tinha um estúdio na cidade, que ela emprestava aos amigos, e o qual tive o privilégio de desfrutar, sem nada pagar, por algumas vezes. Hoje, faço eu o papel da amiga que mora em Paris.

Paris recebe cerca de meio milhão de brasileiros por ano. Uma porcentagem ínfima desse número de visitantes são de amigos, família ou conhecidos meus. Desde que moro aqui, não fiquei um mês sequer – repito: nem um mês sequer – sem receber duas pessoas em média.

Uns ficam na minha casa, outros em outros lugares. Sempre procuro me esforçar para abrir brechas na rotina e ir vê-los, ou recebê-los como hóspedes ou participar da programação. Estar com amigos ou família na cidade nos dá resistência para aguentar a saudade. Mas não é um mar de rosas.

Existe uma rotina gritando. E dar conta de conciliar o visitante com a vida do dia a dia pode gerar estresse, gerar uma sensação de fracasso de não sermos bons anfitriões e uma frustração, por não termos atendido a alguns apelos ou expectativas. Sem contar o acúmulo das tarefas que foram deixadas para depois. E sem esquecer do orçamento, que nem sempre acompanha a programação dos visitantes.

Na pele da amiga moradora de Paris, percebo que a gente vira uma espécie de Torre Eiffel. Até quem não tinha muita intimidade conosco, na cidade de origem, acaba querendo nos ver. Afinal, é legal mesmo estar com alguém que é da sua cidade natal e da outra a que se está visitando ao mesmo tempo.

Antes de morar fora, uma amiga expatriada em outro continente me alertou: “Ana Paula, tenha em mente: você não é hostel, você não é agência de turismo, você não é help-desk“. Sim, as pessoas nos procuram muitas vezes acreditando que Paris é nossa, e que está no nosso bolso. Creem que dominamos uma das maiores capitais do mundo de olhos fechados.

Mal sabem eles que, nesta cidade tão incensada, também batem corações frágeis, cheios de angústias, com contas a pagar e que precisam enfrentar adversidades que começam desde a  língua e vão até os hábitos alimentares (tenta fazer dieta na terra do melhor pão e manteiga do mundo!). Mas como diz um amigo filósofo “se é vida, também tem amargura”. Mesmo em Paris.

Temos muitos enfrentamentos e quase ninguém ao redor para fazer o papel de hostel, help-desk ou guia turístico. Só que dificilmente enchemos nossos amigos ou família do outro lado do oceano com os nossos problemas. Até porque, alguns deles nos responderiam “ué, mas você está aí porque quer”. Sim, somos e temos prazer em ser o amigo, o filho, o irmão, a sobrinha, a prima que mora em Paris. Mas nem sempre estamos disponíveis, temos as melhores dicas ou podemos ajudar em tudo.

Portanto, ao chegarem por aqui, tragam abraços, uma caixa de Mate Leão e uma certa tolerância com a vida de um ser humano que não é perfeito, mas que faz de tudo para recebê-los bem. Pois somos predestinados e já faz parte do pacote de expatriado – assumimos e aprendemos a lidar com isso –  ser a porta de entrada para muitos queridos que desembarcam na iluminada cidade dos sonhos de tanta gente.

Com todas as dificuldades, só temos duas coisas a dizer:

Sejam bem-vindos a Paris! E voltem sempre!

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3 comentários

  1. Adorei moro nos arredores de Paris a 3 anos e fica difícil às vezes dar conta da rotina e dos amigos, tentá-los nos esforçar e claro mas lembramos que não estamos de férias! Ótima crônica! Sucesso

  2. Abraços!…,sempre se fica satisfeito qdo deparamos na vida com pessoas predispostos só convívio.Bravos!