Suruba

Em breve celebrarei 7 anos do meu exílio voluntário aqui em Paris. Em 2013 comecei a ficar de mal com a Pátria Amada, por inúmeros motivos. Dentre os quais, um movimento crescente de desqualificação da democracia. O outro, um movimento de banalização da corrupção, como se o molho socialista fosse capaz de disfarçar o gosto amargo das consequências dessa conduta na estrutura sócio-econômica-cultural do país onde nasci. O resto é história.

Entre Copa do Mundo e Olimpíada, o sonho de um país promissor da capa da The Economist foi para o brejo fazendo arminha com a mão. No meio da pandemia, o negacionismo institucionalizado é assustador.

Mas a gente não consegue largar as raízes tão facilmente. Sempre fico comparando as coisas entre Brasil e França – tentando imaginar como seria minha vida se para cá não tivesse vindo.

Lembro de que um dos meus maiores medos quando aqui cheguei era não conseguir trabalhar. Isso praticamente nunca aconteceu. Sempre tem gente me chamando para um trampo. E ainda sempre na minha área. Então, aqui, por enquanto,  tem sido melhor.

No momento atual, além de ser grata por  ter muito trabalho, todos dias respiro aliviada por dois outros motivos: não peguei Covid e estou longe de um país mobilizado por um programa de TV no qual tem gente confinada. 

É. 

Como diria um bordão de um antigo programa humorístico, “você não quer que eu volte”. Você não quer que eu volte mesmo não, Brasil. Amancebou-se com a extrema-direita retrógrada, que trocou o capuz do carrasco pela conduta genocida de nada fazer. Deixe Manaus agonizar que eu não tenho nada a ver com esse vírus.

Embora as coisas aqui na Cidade Luz estarem mais para trevas, com um movimento confina-desconfina que parece até fetiche das autoridades, ainda é melhor do que se vê do outro lado do oceano. 

Mas…como há regras para circulação e funcionamento restrito de alguns estabelecimentos, o povo aqui na França,  está se aglomerando clandestinamente. 

Outro dia, por exemplo, saiu uma notícia sobre um restaurante que funcionava sem autorização, no melhor estilo speak easy, dos tempos da Lei Seca americana. Uma denúncia levou os tiras até o local. E na hora da dura da polícia, surpresa: entre os clientes encontravam-se jantando um promotor de justiça e…um policial! Há! Conduta proxeneta é tudo igual, só muda o passaporte.

Dias depois, foi um clube libertino – para quem não sabe, lugar tipo uma boate onde a turma se deixa levar em práticas sexuais não-ortodoxas. No português claro, sexo grupal. 

Eu fiz um trabalho para a cadeira de Sociologia do Gênero, quando fiz uma graduação na Sorbonne Paris 1. Queria entender o papel da mulher nesse contexto. Um dia conto a vocês. Hoje eu só quero compartilhar que, como pesquisadora e respeitando a deontologia, vi de perto como rola a libertinagem na prática.

É como fazer mergulho: quando você está a 30 metros debaixo do mar, o mundo é outro. Entrevistando praticantes e olhando com os olhos que os bichinhos irão devorar um dia, enxerguei uma vida impossível de sequer imaginá-la. E eu que me achava safadinha, tenho muito feijão com arroz ainda pra comer…

Ao ler o artigo sobre o encontro libertino rolando clandestinamente, não pude deixar de pensar. “Caraca, isso sim é aglomeração! Não é chopinho no Leblon não, mermão! Isso aqui é  Paris, porra! É ménage à trois na causa!”.

Chego ao fim desta crônica desolada. Além de estar fazendo uma mistureba de ideias, uma verdadeira orgia de tópicos que nada têm a ver uns com os outros, cheguei a uma triste conclusão: atualmente, só me chamam para mais trabalho. Ninguém me convida para uma suruba.

Você também pode gostar de: