Nada será como antes

Nostalgia, descobri recentemente, é uma palavra inventada no século XVII por um médico suíço. Ele usou uma mistura de termos gregos, que significam “retorno” e “sofrimento”, para classificar nostalgia como o nome do mal de sentir dor por felizes experiências de um passado que não mais existe.

Ora, escrevi um pleonasmo. Passado nunca existe. Apenas existiu. Embora há os que contestam: só existiria o passado, uma vez que constatamos a velocidade fulgaz do presente. Esse texto, por exemplo, enquanto você o lê no presente, a frase anterior já ficou no passado. E para mim já passou.

Ontem fui comer pastel. Uma nostalgia de domingos nas feiras. Eram cinco brasileiros moradores da Europa. Foi uma tarde de lembranças e o tema central foi referências. 

Perder as referências do lugar de onde viemos e jamais alcançar todas as referências do local escolhido para viver. Eis o eterno fato com o qual um imigrante, expatriado ou foragido precisará conviver. 

Não é nenhum fim do mundo, mas mexe conosco de qualquer forma. Vamos assistir a um filme ou uma palestra e, mesmo entendendo a língua com perfeição, não compreendemos a piada. Era uma referência. Estamos distraídos vendo um youtuber qualquer nos arrancar gargalhadas e ao nosso lado o cidadão da pátria onde agora habitamos não vê a mesma graça. Óbvio, não há nada menos divertido do que explicar uma piada. 

Mas existe o mais doloroso: quando visitamos nosso país de origem, depois de uns três anos sem ir lá, e nos damos conta do quanto novas referências se produzem. Impossível acompanhar. É preciso aceitar. Seremos sempre seres híbridos, pessoas com referências ao passado e com novas referências do presente. 

Sobre o futuro? A única certeza é que nada será como antes. Mas será como antes para alguém? Mesmo aqueles que plantaram-se com raízes em um mesmo lugar? Em uma mesma rotina? Não apostaria. 

Somos seres diferentes a cada minuto. Uma experiência vivida há 20 anos não é a mesma quando a revivemos. Olha bem, pode ser até melhor, não discordo. Mas nunca será como antes. 

Porque o antes é um pão doce do hoje, cujo recheio só saberemos o gosto se experimentarmos. E enquanto não provamos o antes com as papilas gustativas do hoje, tendemos a ficar na nostalgia. Ao mesmo tempo, a consciência de que o hoje será o antes do amanhã é uma descoberta muito prazerosa.  

Tudo passa, as delícias passam, mas as dores também. E nesse processo de traduzir a nós mesmos a cada balanço das horas, seja em locais desconhecidos ou familiares, a nostalgia vai dando lugar ao saber viver. Não tem manual, mas é bom aprender. 

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