Mãos

Poucas coisas me comovem tanto quando afago nas mãos. Nem precisa ser nas minhas, basta eu ver duas pessoas tocando-se nas extremidade e já me derreto.

Por vezes, enquanto as mãos se enlaçam, os olhares andam perdidos ou os rostos andam desviados a pontos cardinais distintos. Mas as mãos estão ali, conectadas, como um grifo gestual do conceito de estar junto.

Costumo observar o gestual das pessoas. Não existe material mais rico a um cronista do que xeretar o movimento alheio. Desde os tempos de Rio de Janeiro, gostava de ir à praia sozinha, e sempre acompanhada de um livro, por vezes parava para escutar conversas ou observar as pessoas.

É interessante construir histórias a partir de pequenos detalhes fornecidos por estranhos, os quais nunca supõem estarem sendo observados. Nós mesmos volta e meia encontramo-nos naquela posição de estranhos ao outro, tirando foto de uma lata de lixo para enviar ao amigo distante, por causa de uma piada que só vocês dois vão entender.

Quem passa do lado de fora dos “eus aleatórios” pensa apenas ser “mais um maluco fazendo retratos de coisas bizarras”. Ou escreve uma crônica. Agora, no momento, observo um casal de meia idade acariciando-se nas mãos em pleno metrô, num sábado 7:30 da manhã…

O filho adolescente do casal está entretido no telefone. O homem olha pela janela, vidrado no movimento de entra e sai em cada estação. A mulher tem olhar distante, mas nem por isso triste. Mas as mãos estão ali, apegadas numa dança graciosa.

Eu olho muito para mãos na França. Ensinei vários amigos a observarem isso também. Claro, seria uma injustiça classificar as mãos aqui como as mais bonitas do mundo, visto que trata-se de um dado sem nenhuma comprovação científica. Mas meu índice de observação de mãos mundo afora escolheu aleatoriamente o país de Descartes como o local onde as mãos superam-se na estética.

Sejam de homens ou mulheres. As mãos masculinas parecem todas esculpidas por Camille Claudel. Já as femininas, em geral longas e delicadas, transbordam uma beleza natural confirmada pela falta de hábito de frequentarem manicure.

E num país onde o contato de toque médio diário da população não passa de 6 segundos (juro que há estudo), ver duas mãos tocando-se durante uma viagem de 15 minutos em transporte público equivale a uma apresentação inteira de balé clássico.

Através das mãos conduzimos nossa necessidade tátil. Do formal aperto de mão às carícias íntimas em quem se ama. Elas estão ali presentes, como um elo importante entre o eu profundo e os outros eus.

Uma vez um rapaz francês, desses que conhecemos em rede social de encontros, me perguntou “qual parte do meu corpo que você ainda não viu e gostaria que eu te enviasse em foto?”

Respondi sem hesitar: suas mãos. Surpreendi o personagem do outro lado, que obedeceu sem pestanejar. Vendo a imagem das extremidades dos membros superiores do moço, apenas disse “o tipo de mão que eu gostaria de sentir tocando-me”.

Chegando à estação onde vou descer, fiquei pensando que a grande transgressão hoje em dia não é mandar nudes e sim provocar o encontro das mãos…

 

 

 

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